domingo, 24 de março de 2013

O cérebro autista



Estudos recentes têm mostrado mudanças súbitas em algumas áreas cerebrais como o cerebelo e, principalmente, um aumento moderado do tamanho e peso cerebral, que parece acontecer durante a primeira infância.O neurocientista Eric Courchesne do Hospital Infantil de San Diego, mostrou que, embora as crianças com Autismo tenham nascido com cérebros de tamanho normal, têm uma expansão rápida por volta dos dois anos de idade. Esse crescimento é ainda mais acentuado em meninas, embora por razões que permanecem um mistério, apenas 1 em 5 crianças com Autismo são meninas.
O sistema límbico é uma das áreas cerebrais que  se mostra alterado. Essa área está envolvida nas atividades complexas como encontrar significado nas experiências sensoriais e perceptivas, no comportamento social, na emoção e na memória. Também é responsável pelo controle de complexos movimentos habituais com aprender a se vestir ou participar de atividades coletivas. Mantém diversos processos desde a criatividade artística, o aprendizado de uma habilidade, reconhecimento de estruturas faciais, a ligação emocional, a agressão e o vício. Então, anormalidades nessa área cerebral cortam ou proporcionam impressões distorcidas da realidade, levando à inabilidade de efetivamente se relacionar com o mundo a sua volta, provocando um isolamento social. As maiores concentrações de receptores opióides no sistema nervoso central (SNC) estão localizadas no sistema límbico. Apesar de os opióides não exercerem ações analgésicas nessa região, eles provavelmente afetam o comportamento emocional.
Desordens da química cerebral, particularmente envolvendo os neurotransmissores dopamina e serotonina, que protagonizam um papel importante no movimento e funcionamento do sistema límbico, têm sido apontadas.
Estudos mais recentes por Amaral e outros mostraram que a amígdala, uma área associada a comportamento social também é maior que o normal, uma descoberta que Amaral acredita que seja relacionada ao alto nível de ansiedade vista em aproximadamente 80% das pessoas com Autismo.
A neurologista pediátrica Dra. Martha Herbert, em 2005, relatou que o excesso de substância branca nos cérebros dos autistas tem uma distribuição específica: áreas locais tendem a ser super conectadas, enquanto ligações com regiões mais distantes do cérebro são fracas. Os hemisférios direito e esquerdo também são mal conectados. É como se houvesse um excesso de serviços locais competindo, mas nenhum de longa distância.
Esta observação casa-se bem com os estudos de imagem que olham atividade do cérebro ao vivo em pessoas com Autismo. Estudos usando ressonância magnética funcional mostram uma falta de coordenação entre as regiões do cérebro, diz Marcel Just, diretor do Centro Carnegie Mellon de Imagem do Cérebro Cognitiva em Pittsburg, Pensilvânia. Just escaneou dezenas de pessoas com Autismo entre 15 e 35 anos, com QIs na faixa normal, dando-lhes tarefa para pensar enquanto ele monitorava a atividade de seus cérebros. "Uma coisa que você vê, diz Just, é que a atividade em diferentes áreas não está acontecendo ao mesmo tempo. Existe uma falta de sincronização, tal como a diferença entre uma sessão de improviso e um quarteto de cordas. Em Autismo, cada área faz sua própria atividade".
O que ainda não é claro é se o problema de inter-conectividade é o resultado do Autismo ou sua causa, ou talvez um crescimento anormal do cérebro tenha a ver com o sistema imunológico; pesquisadores no Johns Hopkins descobriram sinais de que os cérebros dos autistas têm inflamação crônica.
As pessoas com Autismo mostram ser capaz de usar seus cérebros de formas incomuns; memorizam os caracteres do alfabeto em uma parte do cérebro que normalmente memoriza formas. Tendem a usar os centros visuais na região posterior do cérebro para tarefas geralmente manipuladas pelo córtex pré-frontal. Freqüentemente olham para a boca ao invés dos olhos da pessoa com quem estão falando. Seu foco, diz o psicólogo Ami Klin do Centro de Estudos Infantis de Yale não "está em apegos sociais - por exemplo, o olhar carinhoso da mãe - mas em apegos físicos - a boca que se move".
Essas diferenças refletem uma patologia fundamental, ou são efeitos colaterais do mesmo problema básico? Ninguém sabe. O fato de que a intervenção precoce traz resultados para crianças com espectro autista poderia ser uma pista de que alguma dessa anatomia estranha e atividade são secundárias, e talvez até podem ser evitadas.
O pesquisador Alysson Muotri juntamente com Cassiano Carromeu e Carol Marchetto, na Universidade da Califórnia, realizaram uma pesquisa de forma que coletaram pedaços de pele de quatro crianças com a Síndrome de Rett e de cinco crianças neurotípicas. A Síndrome de Rett foi escolhida porque possui uma causa genética clara e por afetar os neurônios de forma mais acentuada, facilitando as comparações e verificações de reversão. No laboratório, a equipe fez a biópsia das peles e depois, reprogramou as células da pele em células de pluripotência induzida (iPS) – idênticas às células-tronco embrionárias, mas não extraídas de embriões. “Pluripotência” é a capacidade de toda célula-tronco de se especializar, ou diferenciar, em qualquer célula do corpo.

A reprogramação genética de células adultas é feita por meio da introdução de genes que funcionam como um software que reformata as células, deixando-as como se fossem de um embrião. Assim, as iPS também podem dar origem a células de todos os tipos, inclusive os neurônios.

Como os genomas dessas iPS vieram tanto de portadores de autismo como de não portadores, no final o trio de cientistas obteve neurônios autistas e neurônios saudáveis. Comparando os dois tipos, o grupo verificou que o núcleo dos neurônios autistas e o número de dendritos, as ramificações que atuam nas sinapses (contato entre neurônios, onde ocorre a transmissão de impulsos nervosos de uma célula para outra) é menor.

Identificados os defeitos, os pesquisadores experimentaram duas drogas para “consertar” os neurônios autistas: fator de crescimento insulínico tipo 1 (IGF-1, na sigla em inglês) e Gentamicina. Tanto com uma substância quanto com a outra, os neurônios autistas passaram a se comportar como se fossem normais.

Muotri afirma que “é possível reverter neurônios autistas para um estado normal, ou seja, o estado autista não é permanente. Além disso, ao usarmos neurônios semelhantes aos embrionários, mostramos que dá para fazer isso antes de os sintomas aparecerem.” ”Os resultados promissores, porém, configuram o que é chamado no meio científico de prova de princípio. Mostramos que a síndrome pode ser revertida. Mas reverter um cérebro inteiro, já formado, vai com certeza ser bem mais complexo do que fazer isso com neurônios numa placa de petri(recipiente usado em laboratório para o cultivo de micro-organismos)”, explica o pesquisador.

Entre as barreiras que impedem a aplicação prática imediata da descoberta está a incapacidade do IGF-1 de chegar ao alvo. “O fator, quando administrado via oral ou pela veia, acaba indo muito pouco ao cérebro. Existe uma barreirahematocefálica que protege o cérebro, filtrando ingredientes essenciais e evitando um ataque viral, por exemplo. O IGF-1 é uma molécula grande, que acaba sendo filtrada por essa barreira”, afirma Muotri. “Temos de alterar quimicamente o IGF-1 para deixá-lo mais penetrante.” Além disso, tanto o fator quanto a gentamicina são drogas não específicas, portanto causariam efeitos colaterais tóxicos se aplicadas em tratamentos com humanos.

O próximo passo, então, foi tentar resolver os problemas dos neurônios com sinais da doença recorrendo a diversos medicamentos. Um deles funcionou, deixou o neurônio normal. A questão é que o medicamento foi eficiente para tratar uma célula em laboratório, em doses maiores traz efeitos colaterais graves. Entraram em um grande desafio em fazer uma triagem de novas drogas para conseguir uma nova medicação que seja menos tóxica e que se pudesse ser administrada no ser humano.


Postado por: Michele às 22h49
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